Sem poesia, a vida seria a morte.


quarta-feira, 30 de março de 2011

Dança

Lancei uma pergunta na chuva

Meus pensamentos cruzam o céu como gaivotas

Da janela dos olhos os corações se despedem sem saber

se voltam para casa

Veio uma resposta estranha,

encontrei uma letra, mas não sei o ritmo.

Se eu dançar conforme a música, quem toca?

CQ

domingo, 27 de março de 2011


eu não conheço essa música
eu não sei dançar nessa altura
tão alto daqui
quase uma vertigem de olhar

mas algo me inclina
me domina
teus braços fortes
confio
me enlaçam a cintura e flutuo

me deixo então me levar no teu ritmo
e paro de lutar pelo compasso
e abandono meu corpo sem peso em tuas mãos
que sabem de cor este som

um instante e posso dançar
enquanto me estendo e me curvo
diante da música
da leveza
de não precisar mais tocar o chão nos sapatos

de ser apenas leve
e ter de novo
asas nos pés
que tocam teu corpo. CQ

sábado, 26 de março de 2011

amor exagerado

no dia seguinte do dia que te esqueci

acordei diferente,
sentindo o vazio imenso
da ausência da tua ausência dentro de mim.

morri ontem. CQ

quinta-feira, 24 de março de 2011

...Porque também existe isso de me sentar naquela cadeira a sua frente, e liquefazer os meus labirintos, desaguando a solidão em palavras. Palavras que vou tecendo nessas linhas até escapar do Minotauro. Mas até onde eu posso te escrever uma carta? Qual a distância segura entre as palavras e o corpo? Ou entre os textos e a pele? Ou entre os tecidos e as teias? Que entre os teus olhos e os meus existe uma carta secreta que ainda não sei escrever, e tenho medo. Pois como deixar que tu enroles de volta as minhas linhas sem junto embaralhar as minhas veias?

Rita Apoena in Baú de Cartas

Seus dedos na minha pele são arrepios.

Todos os pelos, curiosos, levantam-se para ouvir o suspiro..

....

R.Apoena


quarta-feira, 23 de março de 2011

tenho um coração enfaixado de sonhos,
me distraio com tudo, canto tua voz
danço e durmo acordada
todos os dias
desde que nasci na tua lembrança
você abriu meus braços
e descruzou minhas pernas..

olho em volta e me vejo..ando e ando e me descanso
e não me canso de precisar
te dizer da urgência
do teu beijo.

Minha boca padece da falta
da tua. CQ



terça-feira, 22 de março de 2011

Tua ausência cala o mundo, o mar, os ventos.
Tua ausência desaba silenciosamente sobre os
meus dias, soterrando meu outono...
Ela magoa demais o meu sossego.
Tua ausência é essa substância densa
Tua ausência é tão presente que é pessoa...
E me abraça.

Marla de Queiroz

O teu silêncio percorre minhas noites como um fantasma...
uma ausência que se recusa a acreditar-se.
Não morre essa tua presença em mim.
Você está.
Você é,
e isso me basta. CQ


segunda-feira, 21 de março de 2011


Havia um muro alto entre nossas casas.
Difícil de mandar recado para ela.
Não havia e-mail.
O pai era uma onça.
A gente amarrava o bilhete numa pedra presa por
um cordão
E pinchava a pedra no quintal da casa dela.
Se a namorada respondesse pela mesma pedra
Era uma glória!
Mas por vezes o bilhete enganchava nos galhos da goiabeira
E então era agonia.
No tempo do onça era assim.


A namorada - Manoel de Barros


talvez eu seja menos do que se espera
ou um tanto mais do que deveria ser
sou muito leve para me conter
e por demais suave para me prender
forte ao ponto de sobreviver
e bem pouco para o que você merece
por vezes,
densa demais para o que você suporta

mas na medida certa me deixo levar
num passo de voar
numa dança que me seduz a dançar
e no teu canto que me deixo cantar

mesmo assim me liberto de alguma dor, e posso
fazer de tudo
um tanto a mais

para te ver (fazer) feliz.

CQ

domingo, 20 de março de 2011

Fim de semana

Ano bom
chuva nos campos
brisa na varanda
uma linda música que canta
comida boa bem feita
louça bastante na pia
filhos fartos e felizes
sonho que se cria na
solidão amena e doce onde
vou vivendo.

e a vida se lembra de viver de mim.

CQ

Lua

Atravessar nuvens em busca de uma lua

que de tanto ser lua, quer ser céu

E mesmo lua noite a lua quase cheia se mostra clara

tão bela flutua na luz que empresta a ela seu mistério

O sol se ilumina pela lua

Pela mesma lua que

misteriosamente se ocupa, sem culpa,

de assistir ao longe a tempestade que chega nuns olhos castanhos.

CQ

sábado, 19 de março de 2011

"Está tudo planejado:
se amanhã o dia for cinzento,
se houver chuva
se houver vento,
ou se eu estiver cansado
dessa antiga melancolia
cinza fria
sobre as coisas
conhecidas pela casa
a mesa posta
e gasta
está tudo planejado
apago as luzes, no escuro
e abro o gás
de-fi-ni-ti-va-men-te
ou então
visto minhas calças vermelhas
e procuro uma festa
onde possa dançar rock
até cair" Caio F.

beijo mágico

nos olhos,
num beijo que me veja só da beleza que te contemplo
na face,
num beijo que tome a lágrima que desce nessa tua correnteza de ser triste
na testa,
num beijo salvando os teus (e os meus) pensamentos do abismo de me perder de você

tempo mágico
que me traz na tua boca,
num beijo que perfuma meu coração
com a poesia que faço de você. CQ

quinta-feira, 17 de março de 2011

Dor boa

sofrendo do prazer de descobrir
o tanto que seria possível
ser feliz num dia desses
de duração comum de 24hs
que nasce com o mesmo sol de sempre
e que acaba como todos
mas que se muda imediatamente para as melhores memórias
que fazem morada em outro espaço entre nós

agora depois de certos acertos
coleciono dias (misteriosamente felizes)
com você. CQ

Eu queria dormir como uma semente.
E ser apenas uma promessa
do que eu seria
se germinasse. CQ

quarta-feira, 16 de março de 2011


Estranhamente, quero aprender a ser vazia

Gosto de pergunta sem resposta

pelo gosto doce de guardar o vento na caixa e

Ter um cheiro de flor favorito que me recita feito poesia

Gosto muito das tristezas macias e das noites leves sem lua.

Onde se guarda um silêncio demorado

e uma paz

que só experimenta quem não entende.

Quando entende perde a paz.

Ser vazia me cabe tudo.

O cheio mostra o limite.

O vazio pode ser infinito.

Hoje posso ser plena,

vazia de respostas, infinita de possibilidades,

grávida de mim mesma.


CQ

terça-feira, 15 de março de 2011

"Fico tão cansada às vezes, e digo para mim mesma que está errado, que não é assim, que não é este o tempo, que não é este o lugar, que não é esta a vida. (...)então eu não sentia nada, podia fazer as coisas mais audaciosas sem sentir nada, bastava estar atenta como estes gerânios, você acha que um gerânio sente alguma coisa? quero dizer, um gerânio está sempre tão ocupado em ser um gerânio e deve ter tanta certeza de ser um gerânio que não lhe sobra tempo para nenhuma outra dúvida..." CFA

...

Não sei como dizer-te que a minha voz te procura
E a atenção começa a florir, quando sucede a noite
Esplêndida e vasta.
Não sei o que dizer, quando longamente teus pulsos
Se enchem de um brilho precioso
E estremeces como um pensamento chegado. Quando,
Iniciado o campo, o centeio imaturo ondula tocado
Pelo pressentir de um tempo distante,
E na terra crescida os homens entoam a vindima
- eu não sei como dizer-te que cem ideias,
dentro de mim, te procuram.

Quando as folhas da melancolia arrefecem com astros
Ao lado do espaço
E o coração é uma semente inventada
Em seu escuro fundo e em seu turbilhão de um dia,
Tu arrebatas os caminhos da minha solidão
Como se toda a casa ardesse pousada na noite.
- E então não sei o que dizer
junto à taça de pedra do teu tão jovem silêncio.
Quando as crianças acordam nas luas espantadas
que às vezes se despenham no meio do tempo
- não sei como dizer-te que a pureza,
dentro de mim, te procura.

Durante a primavera inteira aprendo
Os trevos, a água sobrenatural, o leve e abstracto
Correr do espaço -
E penso que vou dizer algo cheio de razão,
Mas quando a sombra cai da curva sôfrega
Dos meus lábios, sinto que me faltam
Um girassol, uma pedra, uma ave - qualquer coisa extraordinária.

Porque não sei como dizer-te sem milagres
Que dentro de mim é o sol, o fruto,
a criança, a água, o deus, o leite, a mãe,
o amor,

que te procuram.


Herberto Helder


beijo mágico

nos olhos,
num beijo que me veja só da beleza que te contemplo
na face,
num beijo que tome a lágrima que desce nessa tua correnteza de ser triste
na testa,
num beijo salvando os teus (e os meus) pensamentos do abismo de me perder de você
na boca,
num beijo que perfuma meu coração com a poesia que faço de você. CQ

domingo, 13 de março de 2011

...Viajamos sete léguas
Por entre abismos e florestas
Por Deus nunca me vi tão só
É a própria fé o que destrói
Estes são dias desleais.

Eu sou metal, raio, relâmpago e trovão
Eu sou metal, eu sou o ouro em seu brasão
Eu sou metal, me sabe o sopro do dragão...


Fetiche

meus pés
estão
com saudades
das tuas
mãos.

Lágrima

Vestir uma dor antiga e funda

com vento de poesia e deixá-la ir, voar.

Desapegar de uma dor dói

pode ter o preço de não existir mais.

A dor antiga sustenta e eleva

ao ponto mais alto de uma montanha.

Longe sente

só acima da sua dor pode amparar sinceramente

a dor do outro.

Quando a dor devora, cai sobre nós seu peso, sufoca

e soterra.

Mas se a dor me pertence, me deito sobre suas asas e chego acolhida

onde a chuva nasce.

A chuva é a mãe de todas as águas

suas gotas se perdem na face e a gente pensa

que chora.

Se você não chora, a chuva se oferece à tua face.

Só um poeta sabe doer assim. CQ

sábado, 12 de março de 2011

Isso é tão vasto
que ultrapassa qualquer entender.
Entender é sempre limitado.
Mas não entender pode não ter fronteiras.
Sinto que sou muito mais completa
quando não entendo.
Não entender,
do modo como falo, é um dom.
Não entender,
mas não como um simples de espírito.
O bom é ser inteligente e não entender.
É uma benção estranha,
como ter loucura sem ser doida.
É um desinteresse manso,
é uma doçura de burrice.
Só que de vez em quando vem a inquietação:
quero entender um pouco.
Não demais:
mas pelo menos entender que não entendo
.

Clarice, a Lispector


- Tudo passa, tudo passará...

E nossa história não estará pelo avesso
Assim, sem final feliz.
Teremos coisas bonitas pra contar.

E até lá, vamos viver
Temos muito ainda por fazer
Não olhe pra trás
Apenas começamos.
O mundo começa agora
Apenas começamos.


Metal contra as nuvens - Legião Urbana parte IV



Sonhando em furar as nuvens
sobrevivo numa noite desleal
sobrevoando o nascer de mais um dia assombrado


invadida por uma força desconhecida
de sentir sem saber que ainda sou sonhada

respiro por quase um segundo
nessa consciência

e parecia que o mundo tinha cor de novo.

Tempo de fora
em tudo igual
Tempo de dentro
num tempo que me demora.
Vale a eternidade de espera
para o minuto que muda qualquer tempo
no seu tempo espero,
triste, quase sempre
no meu tempo.
Hoje meu coração me excede
Vive e sonha,
exilado no teu peito. CQ

sexta-feira, 11 de março de 2011


Tudo sobre você

Queria descobrir
Em 24hs tudo que você adora
Tudo que te faz sorrir
E num fim de semana
Tudo que você mais ama
E no prazo de um mês
Tudo que você já fez
É tanta coisa que eu não sei

Não sei se eu saberia
Chegar até o final do dia sem você
Não sei se eu saberia
Chegar até o final do dia sem você

E até saber de cor
No fim desse semestre
O que mais te apetece
O que te cai melhor
Enfim eu saberia
365 noites bastariam
Pra me explicar por que
Como isso foi acontecer

Não sei se eu saberia
Chegar até o final do dia sem você
Não sei se eu saberia
Chegar até o final do dia sem você

Por que em tão pouco tempo
Faz tanto tempo que eu te queria

Música - Tudo sobre você Zélia Duncan

quinta-feira, 10 de março de 2011


Fragmento de poesia


Hoje minha poesia chega assombrada,
cheia de palavras deficientes,
que de tão cheias de sentido,
só podem ser lidas pelo seu silêncio.

Hoje minha poesia se vai cheia de falhas e fendas
feita de palavras que levam sua incompletude no rosto branco e limpo, lavado do sal
de meias palavras lidas nos seus espaços,
pesadas por sua leveza de serem quase vazias,
faltantes,
mas que também precisam ser ditas,
e talvez
soletradas. CQ

terça-feira, 8 de março de 2011

dia de mulher

acordada pela luz do dia
o chão da praça beija meus pés
o vento me acaricia os lábios secos
e me soletra um beijo teu
ainda tenho tanto do que me falta
o todo, um tudo, quase inteira

uma vida para ser mulher
e um dia todo para lembrar disso.

CQ

Nua em versos

Não me encontre nua
na madrugada
Procurando poesia

Não me olhe agora
que estou inebriada
por palavras e fotos

Não toque no meu ventre...

Posso parir
Mil versos...

Dafne Stamato

segunda-feira, 7 de março de 2011

Eu me dou melhor comigo mesma quando estou infeliz: há um encontro. Quando me sinto feliz, parece-me que sou outra. Embora outra da mesma. Outra estranhamente alegre, esfuziante, levemente infeliz é mais tranqüilo.
Tenho tanta vontade de ser corriqueira e um pouco vulgar e dizer: a esperança é a última que morre.

Clarice L.


domingo, 6 de março de 2011


cada vez que esta solidão me invade
e me abre a boca
me toma mais para dentro
e dolorida
saciada,
posso pertencer. CQ
Hoje vou ficar quieta, encistada e vou vasculhar meus cantos escuros em busca de relíquias e rendas, umas porcelanas muito finas, papéis guardados, cristais díspares e o brilho dos teus olhos. Vou lembrar da tua cabeça descansando sobre meu ventre e do silêncio que pousava em teus cabelos úmidos. E vou lembrar mais uma vez. E outra. E vou sentir o peso do teu desamparo e da tua entrega e a felicidade sem arabescos, a felicidade branca dos lençóis emaranhados e a mudez embargada da minha voz. E vou lembrar mais uma vez. E outra. E vou esquecer e depois vou relembrar como se há muito tivesse esquecido e vai parecer que encontrei uma jóia atrás da estante. E vou ter meus olhos estrelados como tive naquele dia e vou fechá-los para encerrar em mim teu segredo de fraqueza. Guardarei secretamente comigo o quanto ali me amaste.

Patricia Antoniete

Sempre que te encontro acordo a possibilidade do sol poder atravessar os campos da pele e da palavra... uno-me lentamente aos rumores, aos sons entoados como gestos leves de silêncio que fico a olhar... estendo-me a um campo que espera que eu nasça no meio da palavra como um fruto secreto... separo o mistério da sede... escrevo com a palavra que povoa o teu nome...

Gisela Ramos Rosa

sábado, 5 de março de 2011


Hoje eu não quero a sensatez

Não quero as rugas da lucidez

O equilíbrio na ponta dos pés

Quero os pés descalços

Pisando a terra molhada

A relva orvalhada

Busco o cristal escondido na areia

O desembaraço das minhas teias

Quero o hálito da simplicidade

Em palavras sussurradas

Necessito dos pensamentos arejados

Avessos a toda vaidade

Quero o descompromisso

O desapego

Nenhuma ansiedade

....


Ursula A. V. Maia

A terapia literária consiste em desarrumar a linguagem a ponto que ela expresse nossos mais fundos desejos.


Manoel de Barros

oração da noite

que você não pense nunca em abandonar meus olhos..

CQ
...que a importância de uma coisa não se mede com fita métrica nem com balanças nem barômetros etc.
Que a importância de uma coisa há que ser medida pelo encantamento que a coisa produza em nós.

Manoel de Barros
vontade de comer uma comida
que não sei qual
vontade de fazer alguma coisa
que não sei o que
vontade de mudar alguma coisa
que não sei como..

vontade de estar com alguém
que eu sei quem é.
vontade de mais.

quinta-feira, 3 de março de 2011

Estou aqui agora
Num instante te espero
Por um tempo vivo
Em tempo algum

Um instante me inspira
E te escrevo, te traduzo
Me reabilito a gostar
Me deixo a escolha

Um instante estou
E assim que fecha teus olhos
Inexisto

Um vento que me trouxe
Um instante de brisa
Nesse deserto, nesse oásis

E me leva de volta
Ao instante que esperava
teu beijo

Um tempo
de estar em mim
E de não mais estar

Um instante que eu era nuvem
Perto do céu, mas agora tão longe do sol

Hoje anoitece em mim
viro vento
E vou.



meu coração exilado
me excede,

agora que sei o que sou,
virei poesia.

CQ